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Legislação trabalhista em discussão: reformular leis ou sindicatos?

Até que ponto se deve flexibilizar a legislação trabalhista sem que isso implique perda de direitos e descumprimento de normas estabelecidas? A resposta é complexa — com infinitas variáveis. E ainda exige, necessariamente, um fortalecimento das entidades de classe e um diálogo eficiente e permanente entre sindicatos (ou os próprios trabalhadores não sindicalizados), empresas e governo. A iniciativa de aliviar — ou flexibilizar — regras trabalhistas surgiu na década de 1990, com a abertura comercial brasileira, a partir da preocupação em dar opções a empresas em momento de dificuldade. “Elas precisavam enfrentar a crise”, ressalta o juiz do trabalho e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) Ivan Alemão. “O problema é que mesmo que as empresas passaram a continuar adotando esse modelo, que passou de ser a exceção e foi incorporado no sistema sanguíneo das relações trabalhistas, mas sem uma definição certa”, diz.

Por outro lado, reforça Ivan Alemão, as relações empregado e empregador necessitam de um “reajuste”, que depende de uma mudança de perspectiva do trabalhador e dos representantes sindicais. “Não estamos mais na década de 1990, quando o neoliberalismo mexia com estruturas, com alto índice de desemprego e terceirização. O trabalhador tem que ceder alguma coisa. Normalmente, o que acontece é que as negociações agora significam apenas um ganho a mais. É necessária uma avaliação clara e profunda dos resultados das negociações”, aponta.

Do outro lado, os sindicalistas reclamam de pressão. Ela existe mesmo? Ricardo Patah, presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT) e do Sindicato dos Comerciários de São Paulo, garante que sim. “A flexibilização não deveria significar descumprimento das leis trabalhistas. Mas ela precisa ser feita de forma prograda. Todos queremos um novo Brasil. Senão, sempre vai significar perda de direitos adquiridos. Deve haver participação equitativa entre área sindical, empresarial e governo”, avalia.

O professor Ivan Alemão, porém, reforça que não é possível debater formas eficientes de se regulamentar esta ou aquela norma sem que aconteça uma reorganização sindical. “O trabalhador está em uma situação um tanto desesperada. Ele já passou por uma situação pior de desemprego, mas se encontra ainda desorientado — especialmente em relação aos sindicatos que não têm uma definição exata do seu papel”, diz. Alemão alerta, por sinal, para o que chama de “sindicalismo de cúpula, institucional, jurídico quase restrito a negociar com a classe patronal”.
Ricardo Patah, por sua vez, concorda que há um problema estrutural nas representações de classe. “Sempre percebo que tivemos um ápice do movimento sindical na ditadura. Naquele momento havia um encantamento, pois tinha um objetivo, um propósito. De lá para cá se acomodou e temos uma legislação com regras ruins para regular sindicatos e muitos nascem com propósito de ganhar dinheiro”, dispara. “Para isso, é preciso de um movimento forte, bem definido e claro”, completa.

A classe empresarial também reforça a necessidade de uma revisão das estruturas sindicais. “Você vê as centrais, de certa
forma, querendo assumir o comando de questões específicas, querendo fazer uma convenção trabalhista única para o país”, critica Paulo Safady Simão, presidente da Câmara Brasileira da Indústria da Construção. “Você imagina se eu posso aceitar uma coisa dessas, com a diversidade que você tem de iniciativas, de estado para estado. Não é possível ter uma regra só. E o sindicato vira um mero fiscalizador. São defeitos que foram acumulando ao longo da história”, afirma.

O secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves, o Juruna, acredita que houve uma evolução trabalhista nas últimas décadas, independentemente de a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), estar ou não desatualizada. “Pôr a CLT como empecilho (para o avanço das relações trabalhistas) não é certo. É positivo negociar tendo as leis como parâmetro básico

Horas extras e folgas

Com o surgimento de oportunidades criadas a partir dos novos trabalhos e as diversas formas de exercê-los, a flexibilização dos regimes trabalhistas entra em pauta até na rua, nas mesas de bares. Os trabalhadores — alguns culpam a CLT pelo próprio aumento do desemprego —veem um ponto positivo nesses possíveis atalhos que surgem do simples questionamento da formalidade celetista.

Para Daniel Reis, 30 anos, auxiliar de documentação, a terceirização é um dos pontos de maior divergência no debate de flexibilização das normas laborais. Segundo ele, isso causa muita insegurança e é um assunto que deveria ser prioridade para o movimento sindical. “Eu posso ser demitido sem nenhum motivo ou ser mudado de local de trabalho”, reclama. No entanto, reconhece que há vantagem no setor informal. “É na questão da mobilidade das horas trabalhadas: posso, por exemplo, chegar mais tarde ou sair mais cedo”, afirma.

O assistente em vendas

Halyson Pinheiro, de 23 anos, conta que seu local de trabalho já está um pouco “flexibilizado” por meio do banco de horas. Isso, segundo ele, traz uma liberdade maior para acordos. “Cria-se
opções que podem beneficiar ambos os lados. Algumas vezes, a empresa precisa de horas extras e elas são recompensadas não somente com o pagamento, mas com folga”, entende.

O mestre de obras Mário Ribeiro, 57, por exemplo, critica a falta de representatividade de algumas instituições sindicais. “As escolas de formação deveria ser obrigação dos sindicatos, mas quem cuida delas são as empresas.” Ele também acredita na reforma da legislação trabalhista, principalmente em relação à quantidade de horas mensais trabalhadas.

Link original da matéria: http://www.em.com.br/app/noticia/economia/2012/10/24/internas_economia,325216/le ...

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