As empresas que precisam abrir as portas aos domingos e feriados
terão ainda mais dificuldade para obter autorização do Ministério do
Trabalho e Emprego (MTE). Os empregadores que tiverem mais de uma
irregularidade registrada sobre jornada de trabalho, saúde ou
segurança, nos últimos cinco anos, estarão automaticamente proibidos de
funcionar nesses dias, ainda que isso seja essencial para suas
atividades. A medida está na Portaria nº 375, do MTE, publicada na
segunda-feira.
“Esta portaria se soma aos elementos que produzem
uma boa qualidade de vida aos trabalhadores”, diz Arnaldo Gonçalves,
secretário nacional de Saúde e Segurança da Força Sindical. O
sindicalista lembra que o movimento sindical luta pela jornada de 40
horas semanais e é fundamental o descanso aos domingos. “É essencial a
negociação tripartite para garantir aos trabalhadores o direito ao
lazer e o funcionamento das empresas, que têm trabalho nestes dias. A
medida permitirá trabalhar as particularidades de cada região, as
culturas dos Estados e de cada categoria.
Irregularidades
No caso de apenas uma irregularidade nos últimos cinco anos, de
acordo com a portaria, o Ministério do Trabalho e Emprego iniciará uma
fiscalização - sem data ou prazo fixo para ser concluída - e só depois
avaliará o pedido de autorização para trabalho aos domingos e feriados.
As novas condições preocupam as empresas. Isso porque 317.693
companhias foram autuadas (incluindo reincidências) nos últimos cinco
anos, conforme Ministério do Trabalho. Representantes da indústria e dos
trabalhadores ficaram surpresos com a publicação da norma e criticaram
sua redação.
Até então, para se obter a autorização do Ministério do Trabalho,
era preciso apenas a concordância dos empregados e do sindicato de
trabalhadores que os representassem, além de laudo técnico emitido por
instituição competente ligada ao poder público municipal, estadual ou
federal confirmando a necessidade. Outra exigência que permanece é a de
que as escalas de trabalho respeitem as normas e legislações vigentes,
garantindo, por exemplo, o descanso semanal remunerado, que deve ser
usufruído no domingo em pelo menos uma de cada sete semanas. Agora, além
de todas essas exigências, determinou-se que não se pode ter
irregularidades na área de saúde, segurança e jornada de trabalho.
Para o integrante do Conselho de Relações do Trabalho da
Confederação Nacional da Industria (CNI), Adauto Duarte, essa portaria
poderá afetar a atividade econômica das empresas e reduzir a liberdade
de organização das companhias. "Hoje, o sistema sindical é mais legítimo
e representativo. Temos 10.388 sindicatos de trabalhadores e 11
centrais que participam da vida política e das grandes negociações de
políticas sociais do país", diz.
Para ele, a vontade dos trabalhadores deveria ser suficiente para autorizar o trabalho aos domingos e feriados, o que está previsto na Constituição. Ainda como a norma não esclarece o que é "irregularidade", qualquer tipo de sanção sofrida ou notificação poderia ser um empecilho para a empresa.
Há atividades que necessitam comprovadamente do trabalho aos domingos, segundo Duarte. Ele cita como exemplo a fabricação de produtos feitos à base de tomate, que precisam de autorização para acontecer no domingo. "O tomate simplesmente apodrecerá à espera de processamento nas indústrias, caso não tenha autorização por motivo de eventuais irregularidades trabalhistas ocorridas nos últimos cinco anos", afirma. O mesmo deve ocorrer no trabalho de manutenção preventiva de aviões, trens e ônibus, que em geral são feitos nos dias de menor movimentação. "Esses impedimentos poderiam culminar em problemas de segurança para a própria população."
Duarte afirma que pretende dialogar com o Ministério do Trabalho para que a norma seja revogada, antes de pensar em uma medida judicial. "Ainda acreditamos em uma solução tripartite que equilibre os interesses do Estado, das empresas e dos trabalhadores."
Para Kelly Escobar, analista de relações trabalhistas do
Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores
(Sindipeças), tem sido cada vez mais difícil renovar essas
autorizações. Kelly afirma que o trabalho aos domingos e feriados tem
sido necessário em alguns momentos, quando há uma alta na demanda das
montadoras. "Essa portaria traz mais uma barreira", diz.
A secretaria de relações de trabalho da CUT, Graça Costa, afirma
também ter sido pega de surpresa com a edição da portaria. "Estávamos
debatendo o assunto com o Ministério do Trabalho, mas não houve nenhuma
deliberação", diz. Para Graça, apesar de colocar mais empecilhos, o
texto dispensa a inspeção prévia da empresa que pede autorização e que
não tem essas pendências. "Nesse caso, fica mais fácil para obter a
autorização."
A portaria é considerada inconstitucional pelo advogado Maurício
Corrêa da Veiga, do Corrêa da Veiga Advogados. Segundo ele, o Estado
não pode interferir na liberdade de negociação das empresas e
trabalhadores. "Apesar de a finalidade ser nobre, de coibir as máculas
em relação ao excesso de jornada e falta de segurança e saúde no
trabalho, isso não poderia ser vinculado à autorização", diz.
O advogado Fernando Cassar, do Cassar Advocacia, diz que, apesar
da redação ser confusa, as restrições só devem valer para empresas que
precisam renovar suas autorizações, a cada dois anos, após o fim da
vigência da convenção coletiva. As atividades consideradas essenciais,
como hospitais, empresas de telefonia e hotéis, por exemplo, não devem
sofrer impacto.
Procurado pelo Valor, o secretário de inspeção do trabalho do
MTE, Paulo Sergio de Almeida, não conseguiu atender a reportagem por
indisponibilidade de agenda.
Comentários
Postar um comentário